É necessário inicialmente fazer uma discussão do termo “estados limites”. Figueiredo propõe essa discussão terminológica: nos EUA e na Inglaterra, usa-se o termo “personalidade-limite” ou “paciente-limite” ou “condições-limite”, o que em português se traduz por “caso-limite”; na França, fala-se em “estados” ou “situações-limite”. Essa categoria de “casos-limite” foi criada para classificar aqueles que se encontravam numa situação fronteiriça entre psicose, neurose e perversão, ou seja, através da ideia de margem, borda e limite, chegou-se ao termo “borderline”.
O autor aponta a dificuldade de diagnosticar esses pacientes, mostrando que há autores que entendem o termo como designando uma síndrome, outros (franceses, principalmente) entendem mais como um “estado-limite”, ou seja, como uma condição que pode estar presente em diversos tipos de quadros psicopatológicos.
Um autor trazido por Figueiredo é Meissner, que discute as diferenças entre a problemática narcisista, que diz respeito à auto-estima, e a problemática borderline, que se refere à coesão e estabilidade do self. No que Meissner denomina como “condição borderline”, a coesão de si encontra-se em perigo, o que implica em questões de vida ou morte. Recursos para protegerem-se seriam: a personalidade “como-se” (Deutsch), o falso self (Winnicott) ou self em branco (Giovachini); ou seja, uma adesão submissa ao outro, um auto-esvaziamento afetivo e ideativo de caráter defensivo.
Otto Kernberg, desenvolvendo as teses de Margaret Mahler, sugere que a estrutura borderline se caracteriza por uma dinâmica instável, oscilante, com transições abruptas, que revela angústias presentes no processo de separação-individuação (“fase de reaproximação”), em que mãe e criança “negociam” o abandono do filho e, ao mesmo tempo, sua solicitação constante. Esse vaivém, quando permanece, impede que o sujeito adquira “autonomia individual” e “constância objetal” – os indivíduos borderline parecem ter uma dificuldade de construir e sustentar uma imagem integrada e estável de si. Além das idéias de Mahler, Kernberg também considera as defesas primitivas, encontradas nas estruturas borderline, tais como: cisões e o recurso a identificações projetivas.
Figueiredo traz, ainda, Alethea Horner, que definiu bem o que marca a dinâmica borderline, quais sejam: o padrão oscilatório dos afetos, a questão da instabilidade, das flutuações, das oscilações, das mudanças bruscas (“vaivém dos humores e das reações”), o que muitas vezes se confunde com a psicose maníaco-depressiva.
Pelo fato de a coesão do eu não estar assegurada no borderline, um recurso adotado é o apelo à dor, tanto física quanto psíquica, funcionando como um envoltório de um corpo e de uma mente ameaçados pela desagregação.
Referência bibliográfica:
FIGUEIREDO, L. C. “O caso-limite e as sabotagens do prazer”. In: Elementos para a clínica contemporânea. São Paulo: Escuta, 2003. pp. 77-107.