Luto da infância

Mauricio Knobel (1981), no texto “A síndrome da adolescência normal”, define a adolescência como:

 

“[…] a etapa da vida durante a qual o indivíduo procura estabelecer sua identidade adulta, apoiando-se nas primeiras relações objeto-parentais internalizadas e verificando a realidade que o meio social lhe oferece, mediante o uso dos elementos biofísicos em desenvolvimento à sua disposição e que por sua vez tendem à estabilidade da personalidade num plano genital, o que só é possível quando consegue o luto pela identidade infantil” (Knobel, 1981, p. 26).

 

Com essa definição, Knobel nos coloca diante do ponto chave em relação ao qual pensamos a adolescência, que é o processo de luto: básico e fundamental para que a “identidade adulta”, nos termos dele, se consolide.

A ideia central defendida pelo autor é a de que o processo da adolescência se dá a partir de um certo grau de “conduta patológica” que, segundo ele, “devemos considerar como inerente à evolução normal dessa etapa da vida” (Knobel, 1981, p. 27). O título do seu texto já nos indica esse posicionamento de pensar a adolescência como uma “síndrome”. Para o autor, percebe-se nessa “síndrome”, dentre outras características, períodos de: elação, introversão, urgência, desinteresse, crises religiosas – que podem oscilar entre o ateísmo anárquico ao misticismo fervoroso –, intelectualizações, condutas sexuais dirigidas ao heteroerotismo e até a homossexualidade ocasional.

Os processos de luto, para Knobel, obrigam os adolescentes a recorrerem a certas atuações defensivas, que podem ter caráter fóbico, maníaco, esquizoparanoide etc. Para o autor, essas condutas seriam parte da “patologia normal” do adolescente. Contudo, é necessário que essas características se dissipem com o tempo, como todo processo de luto, sob pena de se cristalizar em um quadro patológico. Knobel (ibid.) aponta que a menor ou maior “anormalidade” dessa síndrome se relaciona com os processos de identificação e luto que o adolescente pôde realizar.

Quando os processos de luto dos aspectos infantis perdidos se realizam de forma patológica, Knobel afirma que a necessidade de busca de uma identidade se torna extremamente necessária, o que pode ocasionar o estabelecimento de uma “identidade negativa” – conceito de Erikson (1956 apud Knobel, 1981), que remete a identificações com figuras negativas, mas reais, como no caso de grupos de delinquentes, drogados e outros. Esses recursos dizem respeito ao processo de separação das figuras parentais e da constituição do que Knobel chama de “identidade adulta”, processo esse que exige uma mudança da relação do sujeito com os pais externos e as imagos parentais internalizadas.